Investimento, RPPS

Rápido e Devagar: Reflexões sobre decisões e gestão no RPPS

Entenda, de forma clara e prática, como este tema impacta a gestão eficiente do seu RPPS.

Descubra como os ensinamentos de Rápido e Devagar, de Daniel Kahneman, ajudam a melhorar decisões na gestão previdenciária do RPPS, reduzindo vieses e promovendo mais racionalidade e segurança.
Bifurcação em estrada com um caminho reto e outro sinuoso, representando as duas formas de pensar descritas no livro Rápido e Devagar, de Daniel Kahneman.

Durante o isolamento da pandemia, como muitos, mergulhei nos livros em busca de respostas, entendimento e, quem sabe, algum refúgio intelectual. Foi nesse período que me aprofundei em temas que até então orbitavam minha rotina profissional, mas que ainda não haviam se assentado com a devida profundidade: os conceitos das finanças comportamentais. Desse mergulho nasceram dois artigos que publiquei aqui com base nas obras Ruído: Uma Falha no Julgamento Humano e A Lógica do Cisne Negro, livros que abrem portas para enxergarmos as decisões humanas sob lentes mais realistas — e menos idealizadas. Hoje, porém, quero convidar você para explorar comigo outro clássico: Rápido e Devagar – Duas Formas de Pensar, de Daniel Kahneman.

Kahneman, prêmio Nobel de Economia, nos apresenta dois sistemas que guiam nosso pensamento: o Sistema 1, rápido, intuitivo, impulsivo, e o Sistema 2, mais lento, reflexivo e analítico. Ambos operam simultaneamente em nossas decisões cotidianas, mas é o Sistema 1 que costuma tomar as rédeas quando estamos sob pressão, com pouca informação ou diante de cenários repetitivos. Parece familiar?

Pois bem. Imagine um conselheiro de um RPPS diante de uma apresentação de resultados de um fundo. Ele olha rapidamente o gráfico, vê uma curva ascendente e ouve do gestor que “o fundo vem performando bem no último semestre”. Seu cérebro, regido pelo Sistema 1, acena com a cabeça, satisfeito. Mas eis o perigo: ele não questiona o índice de referência, o nível de risco assumido, ou a concentração da carteira. Ele se deixa guiar por uma impressão rápida, não por uma análise criteriosa. E no mundo previdenciário, onde cada decisão reverbera no futuro de centenas — ou milhares — de vidas, isso é um risco silencioso, porém imenso.

Rápido e Devagar nos lembra que nossas decisões são muito menos racionais do que gostamos de acreditar. Mesmo em ambientes técnicos, como o da gestão previdenciária, estamos constantemente sujeitos a atalhos mentais (os chamados heurísticos) e viéses cognitivos. O viés da ancoragem, por exemplo, pode fazer com que um conselheiro se apegue à primeira rentabilidade apresentada, ainda que os dados posteriores apontem para um risco excessivo. Já o viés da confirmação pode levá-lo a buscar apenas argumentos que sustentem sua convicção inicial, ignorando alertas importantes no relatório atuarial ou na avaliação de cenário macroeconômico.

Outro ponto crucial: o Sistema 2 — aquele mais cauteloso e exigente — cansa. E em uma rotina marcada por volume de documentos, prazos e responsabilidades, é comum que os conselheiros e gestores se deixem levar, ainda que inconscientemente, pelo piloto automático do Sistema 1. A consequência? Julgamentos precipitados, decisões pouco embasadas e uma falsa sensação de controle.

A boa notícia é que conhecer esse mecanismo já é meio caminho andado para melhorar nossa atuação. No contexto do RPPS, essa consciência pode nos levar a criar processos deliberativos mais robustos, incentivar a diversidade de opiniões nos comitês e fomentar práticas de dupla checagem de informações, principalmente nas análises de investimentos e reavaliações da política previdenciária.

Mais do que isso, Rápido e Devagar nos ensina algo valioso: o erro não está em pensar rápido, mas em não saber quando é preciso pensar devagar. A gestão de um regime próprio exige prudência, estratégia e sobretudo lucidez para separar a intuição da análise, a pressa do planejamento.

Termino este artigo com a sensação de que ainda há muito a se explorar nas intersecções entre psicologia e previdência, entre comportamento humano e governança institucional. Mas se há uma lição que vale ouro — e que pode muito bem constar da política de investimentos de um RPPS — é esta: decisões bem tomadas são aquelas que respeitam o tempo do pensamento. E no mundo previdenciário, pensar devagar é um ato de responsabilidade com o futuro.

Se você chegou até aqui, talvez o Sistema 2 já esteja em ação — e isso, caro leitor, é um excelente sinal.

Sua opinião faz toda a diferença.

"Conhecimento é poder”, dizia Francis Bacon — e continua sendo. Para evoluir, é preciso aprender, questionar e aplicar. Só o conhecimento transforma intenção em ação, dúvida em clareza, e esforço em resultado. Quem busca crescer, precisa primeiro entender. E entender exige estudo, curiosidade e coragem para sair do lugar.

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Manoel Junior

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